quarta-feira, abril 23, 2008

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Ele acordou e foi mancando até o banheiro. Escovou os dentes, tirou as remelas e ajeitou os cabelos desgrenhados. Urinou por 6 minutos, lavou as mãos e saiu de lá. Chegou na cozinha, pegou o leite, botou no copo, misturou com o Toddy e matou tudo num gole só. Foi mancando até a sala.

Deu bom dia pra mãe, deu bom dia pra tia. Falou com o primo e cumprimentou o tio. Na varanda, olhou a luz do dia, viu a claridade amarela do sol e ouviu o zunido das cigarras. Sentou, folheou o jornal e viu as principais notícias do dia. Voltou até a sala e sentou pra assistir o bom desenho animado de cada dia. Deu algumas risadas e, quando acabou, foi mancando para o escritório.

Ligou o computador como de costume e botou um bom rock 'n roll nas caixinhas distorcidas. Deixou a música rolar e abriu o Gmail. Leu os novos emails, reviu alguns mais antigos e encaminhou outros. No Orkut, mandou alguns recados e respondeu outros. Deu uma passada nos habituais fóruns, debateu algumas palavras e verificou as suas comunidades.

Ficou online no MSN. As mesmas pessoas de todo santo dia. Cumprimentou algumas, outras vieram lhe dar oi e mudou a sua saudação. O almoço chega a mesa. Hora de lavar as mãos. Repara cabelos no chão branco e constrói imagens com eles. Pelo cheiro que não sente, a comida já estava pronta e à espera.

Sente falta dos cheiros. Cheiro da comida, cheiro das flores, da mata, dos cabelos com xampu, de perfumes, das amigas, da pele ensaboada, do plástico novo, do vinil, da capa emborrachada, do chiclete de framboesa, da bala de hortelã e da banana na fruteira. O gosto também não é mais o mesmo. Tudo anda mais salgado que o normal.

A tarde prossegue e a rotina é a mesma: andar devagar, fazer hora para os dias passarem e os machucados melhorarem. O computador é seu lazer, vício e distração. Mata saudade dos amigos, manda sinais, lê notícias e cria textos. Revisa algumas coisas que pensou no dia anterior e escuta mais música - outro ritmo, de rock.

As conhecidas dores da tendinite aparecem nos braços para lhe darem oi. Alongamentos feitos, já ficou horas demais na frente do monitor. Hora de mudar pra tv. Assiste alguns clipes, vê algum seriado e se diverte com aquele desenho amarelo. Come qualquer coisinha e aproveita pra trocar uma idéia com as mulheres da casa.

Lembra de coisas que andaram acontecendo, de como a vida era antes do acidente e até de sua infância e adolescência, que sempre vêm à tona. Se tem algo que ainda funciona bem é a sua memória. Essa não se abalou mesmo com a pancada. Lê a revista preferida, de informática, e ouve um pouco do que mais gosta no seu mp3.

Noite chegando, jantar se aproximando. A mesa é posta e as panelas vão ao fogo. O primo sempre correndo e jogando bola dentro de casa. A comida chega à sala de jantar e a família se reúne em torno dela. O primo cria caso e faz a mesma manha de sempre pra comer. As conversas variam entre as ameaças de castigo e as notícias do que aconteceu naquele dia pelo mundo.

Frutas vêm como sobremesa. A família encerra suas últimas degustações da noite. Os últimos restam sobre as cadeiras falando algumas coisas triviais. Mancando até o computador, ele volta a ser seu companheiro. Sua amada está online. Muitas letras, prosas e versos são trocados entre os dois, até o "beijo, boa noite, dorme bem.." O último vídeo de longboard visto no YouTube é fechado.

Com o joelho latejando, e as barbas já longas, seu último caminhar de hoje é até o quarto. O colchão está lá na mesma posição, junto com o pijama. O abajur acendido pela mãe continua lá também, iluminando. A porta do banheiro é encostada para a última escovação dental completa do dia ser feita. O frágil pedaço de fio dental, como sempre, está largado na pia. Os aparelhos já estão em sua boca.

Com cuidado, sai e fecha a porta. Olha as horas e apaga o abajur. Se abaixa devagar, e deita no colchão que está no chão, ao lado da cama de casal onde já dorme sua mãe. O zunido vindo do ouvido direito fica mais alto agora. Cobre-se com a mesma mantinha de todo dia, e a encosta nas feridas semi-cicatrizadas e borradas com pomada após o banho quente.

Agora só resta fechar os olhos, rezar, fazer aquele pedido especial e sonhar com a mesma coisa de todas as noites: que está junto dos amigos distantes e que o seu olfato voltou - permitindo a ele sentir novamente todo o cheiro bom do mundo com o qual ele sonha e inalá-lo inteirinho de uma vez.

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Mp3 da vez: Black Label Society - Stillborn

sexta-feira, abril 18, 2008

Besouros em maçãs?

Passado um pequeno período longo e turbulento, metálico, ozzyótico, kornítico, de sociedade rotulada negra, e ainda voador (e com direito a hematomas), li hoje um interessante tópico na Info Exame de fevereiro/2008 (pág.18) que considero merecedor de um textinho.

A internet é não só centro de entretenimento, mas também palco de muito trabalho, estudo e de ferramentas extremamente úteis, como os tradutores. Uma frase simples - e de impacto - pode demonstrar a capacidade desses utilitários e seus graus de inteligência artificial e vínculo com a realidade.

Experimente entrar com a frase (atenção às maiúsculas, elas fazem toda a diferença nesse caso!) "Steve Jobs was fired from Apple" (conseguiriam imaginar?) nos principais sítios virtuais que oferecem serviço de tradução. As conversões serão hilárias! - excluindo a do grande Google, futuro dominador do mundo e candidato à Deus.

Pois bem, no Windows Live Translator a frase em português fica "Steve Jobs foi ateado fogo de Apple". No Altavista/Babelfish "Os trabalhos de Steve foram ateados fogo de Apple". No Intertran, o coitado "Steve empregos era incendiado de Maçã". E já no Google Tradutor "Steve Jobs foi despedido da Apple".

Fica até difícil de acreditar em tanta proeza, mas assim é o tal do Google, em tudo. Ele foi criado para funcionar dessa maneira, e não é a toa que, a cada dia, a empresa só cresce mais e valoriza. Agora, se você não botar fé no que leu aqui (assim como eu quando li na revista), entre nos links e faça o teste por conta. É, no mínimo, divertido.

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Mp3 da vez: The Beatles - Strawberry Fields

quarta-feira, abril 02, 2008

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Muita gente já virou pra mim, várias vezes, e me pediu um cigarro. Ou uma seda. Ou ainda quiseram me vender coisas do gênero. Depois de tantos anos, já até me acostumei. Deve ser a minha cara. O fato é: nunca nem aproximei um cigarro da boca.

Mas não sou tão "careta" assim, como são taxadas as pessoas que nada fumam ou bebem.. Curto lá uma cachacinha de vez em quando, e por que não tequila e caipirinha também? Chopp, só bem gelado e esporadicamente. Quem não bebe, não fuma ou não tem sequer um hábito não necessariamente saudável não é confiável.

Sei que agora, por ser taxativo, estou correndo o risco de ser taxado como radical, ou pior, maluco. Mas, pense bem. Uma pessoa que nunca experimentou qualquer tipo de substância que não seja sinônimo de saúde e bem estar ou que a tire de seu estado 100% normal (que às vezes já nem é tão normal assim), tem medo daquilo que pode encontrar no espelho. Se ela não confia em si mesma, como é que, eu, então, vou botar fé?

Não estou aqui, de forma alguma, querendo incentivar as pessoas a usarem qualquer tipo de substância nociva ou alucinógena. Só acho auto-covardia alguém nunca dar a chance de sua consciência, raciocínio e atitudes alcançarem um outro nível de lucidez em algum momento.

Sabemos por consenso que o desconhecido sempre foi motivo de estranhamento ou desconfiança. E o receio de arriscar, e não saber o que encontrar, é o que faz as pessoas manterem-se longe daquilo sobre o qual não tem domínio.

Isso pode até parecer papo de bebum ou drogado, mas não é. Isso aqui é papo de cabeça aberta. Isso aqui é uma apologia ao não radicalismo. Isso é conversa de quem sabe que, sem flexibilidade, não se vai ao longe. Isso é história de quem acha que uma história não tem uma só versão, um ponto de vista único e singular.

Em suma, isso é discurso de quem já foi muitas vezes rotulado de algo que não é, mas que também não condena nem se envergonharia se fosse, pois vergonha é não ter coragem de se confrontar com o novo.

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Mp3 da vez: Raul Seixas - Metamorfose Ambulante

Coisa de louco!

Após 22 - VINTE E DUAS - postagens, e 12 anos e 1 mês da morte dos saudosos e talentosos Mamonas Assassinas, paro para fazer uma observação lingüística aqui:

- Alguém já havia visto o adjetivo "meteórico(a)" ser usado antes da morte dos 5 músicos?

Porque eu nunca, senão para definir a carreira - meteórica - deles (nem eu consigo me segurar!), e interrompida pelo trágico destino.

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Mp3 da vez: Mamonas Assassinas - Sábado de Sol